Gestão ambiental e a sustentabilidade
A gestão ambiental e a sustentabilidade são temas de grande relevância para empresas e sociedade em geral. A sustentabilidade é um modelo de desenvolvimento pautado em múltiplas dimensões (social, ambiental, econômica, cultural, etc.), ao passo que a gestão ambiental é o processo de identificação, avaliação e controle dos impactos ambientais de atividades humanas. O presente artigo tem como objetivo contextualizar a sustentabilidade e analisar as principais abordagens e modelos de gestão ambiental.
A partir de discussões globais levantadas por obras como Primavera
Silenciosa (CARSON, 1963) e “Limites do Crescimento” (MEADOWS et al.,
1972), bem como na Conferência das Nações Unidas de Estocolmo (1972), emergiu,
no relatório de Brundtland (1987, p. 5), o conceito de desenvolvimento sustentável
como “aquele que satisfaz as necessidades das gerações atuais sem comprometer a
capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades”. A
sustentabilidade passou então a ser um novo paradigma, inclusive no setor
empresarial, se consolidando o conceito de Triple Bottom Line, pautado na
conciliação entre as dimensões social, ambiental e econômica (ELKINGTON, 1994).
Recentemente, a ONU estabeleceu 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável
(ODS), que servem como balizadores de políticas públicas e ações empresariais.
Desta forma, a sustentabilidade torna-se um objetivo global,
aplicado a todas as organizações, sejam públicas, sejam privadas. A discussão é
maior, porém no âmbito privado, uma vez que ainda persiste o ceticismo sobre da
conciliação entre o lucro (e sucesso) empresarial e a preservação ambiental
(DAMODORAM, 2020). Por outro lado, nos últimos 40 anos, as empresas, antes
acusadas como “vilãs”, adaptaram as suas estratégias de negócios, atuando como
protagonistas das causas socioambientais. Não se trata de enxergar as empresas
como novos “heróis” para solucionar a atual crise ecológica, mas sim reconhecer
que as empresas devem deixar de ser problemas e passar a fazer parte das
soluções, sendo importantes pressões do governo, do mercado e da sociedade (BARBIERI,
2023).
As pressões do governo incluem: a) Punição, através da
aplicação de multas às empresas que não cumprem a legislação ambiental; b)
Incentivo – reduzindo impostos das empresas que adotem boas práticas
ambientais. No âmbito governamental, as legislações voltadas à sustentabilidade
se solidificaram a partir da década de 1970, inicialmente nos países
desenvolvidos, embora existam iniciativas anteriores, porém de viés mais
paisagísticos, a exemplo da instalação do primeiro parque ambiental de
YellowStone, nos EUA, ainda no século XIX. No Brasil, a Lei 6.938/81 dispõe
sobre a Política Nacional de Meio Ambiente (PNMA) e é considerada um marco na
gestão ambiental governamental do país, ocorrendo avanços após ela, como: os
Art. 20 e 205 da Constituição Federal de 1988; a Lei de Crimes Ambientais; a
Política Nacional de Recursos Hídricos; o Estatuto da Cidade; as resoluções do
Conselho Nacional do Meio Ambiente, entre outros. Apesar disso, no Brasil,
prevalece a máxima de que “a legislação ambiental é boa no papel, mas não
funciona na prática”, o que decorre do fato da maioria das leis não serem
oriundas de iniciativas populares – a própria PNMA foi baseada na legislação
francesa. Com isso, as leis não refletem os sistemas de valores da sociedade
(BARBIERI, 2023).
A pressão do mercado ocorre através de: 1. Investidores e fundos de investimentos sustentáveis, que incluem a análise socioambiental como critério para investir numa empresa, com suporte em relatórios sociais como do Ibase, do Instituto Ethos e do GRI. É comum também as empresas de capital aberto atraírem mais investidores quando participam de índices como o Índice Dow Jones de Sustentabilidade; 2. Linhas de financiamento bancários próprias para empresas sustentáveis, oferecidas por bancos públicos como o BNDES ou pela iniciativa privada, a exemplo das instituições financeiras que seguem aos “Princípios do Equador”; 3. Certificações Ambientais: apresentam uma garantia técnica aos stakeholders (as partes interessadas, como investidores, financiadores, fornecedores e clientes) e às empresas. Os stakeholders muitas vezes não possuem tempo ou conhecimento técnico para fazer uma avaliação minuciosa da gestão ambiental implementada por uma empresa. Os certificados ambientais fazem justamente este serviço. O exemplo mais proeminente é a ISO 14.001, que trata da instalação de um Sistema de Gestão Ambiental na organização (ALVES, 2016).
A Pressão da Sociedade é a mais importante para que empresa
exerça a Gestão Ambiental Empresarial, afinal tanto o governo como o mercado
são formados por pessoas. Quanto maior a consciência ecológica da sociedade,
maior também será a pressão do governo e do mercado. Um típico exemplo são as
Organizações Não-Governamentais (ONGs) ecológicas, que protestam contra
empresas que agridem ao meio ambiente. Esses tipos de ONGs são as que mais
crescem no Brasil e possuem inúmeras estratégias para pressionar empresas que
desrespeitam o meio ambiente (NINA, 2020). Elas perceberam que, de acordo com o
princípio da corresponsabilidade, é mais eficaz pressionar as instituições
bancárias do que as indústrias e empresas em geral. Houve grande pressão das
ONGs para que os bancos aderissem aos princípios do Equador, supracitados. Como
boa parte das empresas precisam desses financiamentos, acaba ocorrendo um
efeito cascata, no qual a tendência é que a implantação da Gestão Ambiental
Empresarial passe a ser questão de sobrevivência no mercado (BARBIERI, 2023).
É na sociedade também que estão os clientes. O nicho de
mercado composto por clientes sustentáveis, particularmente, tem maiores níveis
de renda e escolaridades. De acordo com Alves (2016), os produtos sustentáveis
costumam ser 40% mais caros do que os simulares comuns, em virtude de dois
motivos: a) custos de oferta, considerando os gastos para adequar o produto aos
padrões ambientais; b) demanda, uma vez que possuem maiores rendas, os
consumidores sustentáveis estão mais dispostos a pagar caro por um produto que
seja ecologicamente correto.
Uma pesquisa do Instituto Brasileiro de Opiniões Públicas e
Estatística (IBOPE, 2018) apontou um crescimento histórico no número de
vegetarianos no Brasil, constatando que 14% dos brasileiros se declararam
vegetarianos e 55% consumiriam mais produtos veganos se estivessem indicados na
embalagem. Além disso, o estudo mostrou um crescimento de 75% da população
vegetariana nas regiões metropolitanas, justamente aqueles cujos habitantes
possuem maior nível de escolaridade e renda familiar. Por fim, o cliente sustentável
apresenta uma característica diferencial: ele possui uma causa, aumentando,
portanto, as chances de ser fiel e defensor a um produto ecologicamente
correto. Considerando as novas características do marketing (4.0), ter
um cliente “defensor” do produto é uma das principais vantagens de uma empresa
(KOTLER et al., 2017).
Mas para que se possa aproveitar essa oportunidade de
mercado, as empresas devem implantar a gestão ambiental, a qual, conforme Barbieri
(2023), pode ser implementada com base em três abordagens: I) Abordagem corretiva: voltada para o cumprimento da
legislação, com a poluição sendo tipicamente tratada apenas no final do
processo produtivo (end-of-pipe); II) Abordagem
preventiva: voltada ao uso eficiente dos insumos, redução de custos e
aumento a produtividade, como eliminação dos rejeitos na fonte, antes que sejam
produzidos e lançados ao meio ambiente; III) Abordagem Estratégica:
visualiza a questão ambiental como uma vantagem competitiva, com preocupação
não está apenas com os processos internos da empresa, mas com toda a sua cadeia
de suprimentos. Não adianta, por exemplo, a empresa ser sustentável se seus
fornecedores não forem.
Ainda para Barbieri (2023), a gestão ambiental pode ser
implementada por meio de vários modelos, como: a) Administração de Qualidade
Ambiental Total, baseada na ISO 14.001, uma adaptação da gestão da qualidade
(ISO 9.001); Produção Mais Limpa (P+L), baseada na hierarquia da logística
reversa, que inclui: não uso, redução, reuso, reciclagem e disposição final
adequada; Ecoeficiência, baseada no indicador de valor do produto dividido pelo
impacto ambiental gerado; Design for Environment (Designer para o meio
ambiente), que visa resolver os problemas ambientais na fase de projeto, antes
que eles surjam; Modelos Inspirados na Natureza, baseados na formação de uma
rede de empresas a partir dos ciclo biogeoquímicos em que os resíduos de uma se
tornam insumos de outras, a exemplo do parque de Kalundborg (Dinamarca).
Desta forma, conclui-se que a sustentabilidade, pautada nas
dimensões básicas social, ambiental e econômica, se estabelece cada vez mais
como o novo paradigma do desenvolvimento ao nível global, sendo imprescindível
às organizações se adaptarem cada vez mais através da gestão ambiental. O maior
dilema ocorre no setor privado e versa sobre a conciliação entre lucro
econômico e preservação ambiental, de modo que as empresas recebem diferentes
pressões para serem sustentáveis: do governo, do mercado e da sociedade. As
empresas podem ainda escolher entre três abordagens ambientais: corretiva,
preventiva e estratégica. Nesse último caso, alguns modelos de gestão se
destacam, como: gestão da qualidade ambiental total; produção mais limpa,
ecoeficiência, design for environment e os modelos inspirados na natureza.
Referências
ALVES, R. Administração verde: o caminho sem volta
da sustentabilidade ambiental nas organizações. Rio de Janeiro: Elsavier, 2016.
BARBIERI, J. Gestão Ambiental Empresarial:
conceitos, modelos e instrumentos. 5ª ed. São Paulo: Saraiva. 2023. 280p.
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dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 2010.
BRASIL. Lei 6.938, de 31 de agosto
de 1981. Dispõe sobre a Política
Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e
dá outras providências. Diário
Oficial da União, Brasília, DF, 1981.
BRASIL. Lei 9.605, de 12 de fevereiro de 1998. Dispõe sobre
as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas
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BRASIL. Lei nº 9.433, de 08
de janeiro de 1997. Institui a Política Nacional de Recursos Hídricos, cria o
Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, regulamenta o inciso
XIX do art. 21 da Constituição Federal, e altera o art. 1º da Lei nº 7.990, de
28 de dezembro de 1989. Diário Oficial da União, Brasília, 09 de janeiro, 1997.
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